MODA INFANTIL

Por Paty Juliani

spirodiro verão 2016 (2)

Há muito tempo queria escrever sobre Moda Infantil. Como design de moda, esse assunto sempre me interessou e foi objeto de pesquisa. Sei que antigamente, roupa infantil era apenas uma roupa de adulto feita com medidas menores. Sei também que a moda infantil, assim como todo segmento de moda, cresceu e se profissionalizou. Mas, como mãe, sempre me deparo com as seguintes questões: apesar de todo avanço, estamos realmente respeitando a infância quando desenvolvemos roupas para crianças? O que vemos no mercado é realmente adequado? Há conforto para que a criança possa ser realmente criança? A tendência a erotização precoce vai continuar imperando? E o consumo exagerado – como lidamos com essa questão no universo infantil?

Para conversar sobre algumas dessas questões, resolvi bater um papo com uma estilista da qual sou fã.

silvia ferraz

Silvia Ferraz é de Campinas e se formou em Moda pela Faculdade Santa Marcelina em 2008. Depois de formada, trabalhou um ano com o estilista Ronaldo Fraga – como assistente do estilista e como estilista de sua marca infantil, Filhotes. Em 2010, participou do concurso Ponto Zero, realizado pela Casa de Criadores com parceria do Mercado Mundo Mix e Abit e foi vencedora. A partir daí, lançou sua marca: Spirodiro.

Conheci Silvia Ferraz quando estava fazendo um curso sobre moda infantil no Senac. Naquela época, fui até seu ateliê conversar um pouco sobre quase tudo e me encantei.
Silvia tem brilho no olhar, paixão pelo que faz e muita criatividade. Ela sabe da responsabilidade que é criar para criança e faz isso com maestria. Suas criações são lúdicas, alegres, coloridas e confortáveis. É delicioso ouvir ela falando que a roupa vai além do vestir/cobrir um corpo e que a proposta da sua marca é justamente “explore seu mundo”.
Dessa vez, conversamos virtualmente e Silvia foi novamente muito carinhosa e generosa.

PJ: Por que moda infantil?
Silvia: Me identifico com o público infantil, pois imagino que penso como eles! Vejo muita magia. Tenho uma imaginação muito fértil, desde criança…sinto essa vontade de mostrar para eles que vale muito mais a pena curtir a infância nos mínimos detalhes.

PJ: Qual o diferencial de sua marca? Fale um pouco sobre a Spirodiro.
Silvia: O diferencial da marca está na nossa visão de mundo, onde tudo é possível, onde tudo pode se tornar mais fácil a partir de um sorriso, a partir de uma magia que a gente acredite.
Tudo isso aparece nas peças de forma lúdica. Moda infantil feita para criança de verdade! Com a linguagem de criança. Dessa maneira elas se identificam e entendem o que é moda: expressão do que acreditam.
Não gosto de roupas “mini adultos”, isso não “cabe” numa criança. Criança é muito mais que isso. Ela traz referencias de um mundo sem tamanho. Sua moda também deve ser assim: infinita! Se não, começamos a trazer barreiras para a imaginação, padrões de beleza e estética e, a função do estilista é justamente o contrário: propor o impossível através de peças possíveis.
A Spirodiro considera as crianças como “parceiras” em seu trabalho. Seu processo de criação se baseia em referências retiradas do universo infantil, através de conversas e entrevistas com os pequenos! A Spirodiro está sempre de “olho nos pequenos” e leva em consideração desde diferentes fases de crescimento até temas importantes para as crianças, como os monstros. E devolve tudo isso em forma de roupas, Moda Infantil.
O estilo da Spirodiro é usar a alma pelo lado de fora! Isso se materializa em produtos interativos, em que o vestir vira uma diversão sem tamanho. Seja interação na estampa, que pode desenhar feito um quadro negro, ou na própria modelagem que vira do avesso e se torna outra peça!!
O processo de produção é super cuidadoso, com a criação e modelagem das peças feitas internamente, assim como controle de qualidade. Apenas corte e costura são terceirizados. A Spirodiro também tem um viés social muito bacana e opta por costureiras que trabalham em casa, assim ficam mais próxima da família e poder ter seu próprio negócio.

spirodiro (5)

PJ: Como foi trabalhar com o Ronaldo Fraga? O que você trouxe dessa experiência?
Silvia: O Ronaldo é fora do padrão do mercado atual, uma pessoa super atenciosa, muito humana e algo além do se espera de um estilista, ele é um criador. Eu tenho um diário escrito com todos esses momentos maravilhosos que eu passei lá, principalmente porque foi o meu primeiro emprego. Eu não vou falar que ele sentou comigo e contou como é todo o processo criativo dele, mas o olhar, o prestar atenção em tudo e todos me fez aprender, eu falo que todo estudante de moda deve ser uma “esponja”. Ele coloca muito o valor da moda brasileira, as referências de dentro do nosso país, o lado de artesanato, bordado, tenho referências de modelagem, de ser 100% algodão a roupa, acho que todo lugar que você trabalha você guarda as coisas boas com você.

PJ: Por que essa tendência em criar roupas para “miniadultos” ao invés de crianças?
SF: Acredito que essa tendência seja decorrente de uma sequência de acontecimentos e comportamentos da sociedade em geral. Vivemos exigindo que as novas gerações sejam fortes, qualificadas para o mercado e para a concorrência. Infelizmente isto também é transmitido para as crianças.
Hoje, a maioria deixa de fazer aulas de artes e música para começar aula de russo e reforço em matemática. É justamente na infância que se desenvolve as qualificações e os interesses pessoais de cada um. Se não houver referências lúdicas, de um universo próprio, os pequenos começam a viver no mundo dos adultos. Eles não têm culpa alguma, apenas se comportam de acordo com o ambiente em que vivem.

spirodiro verão 2016

PJ: Como você vê o mercado da moda infantil atualmente?
SF: Analisando as marcas de hoje, vejo que muitas nascem dando continuidade à marca adulta. Então, são estilistas que sentem a necessidade de alongar sua marca para os filhos de suas clientes, mas infelizmente, a maioria esquece que está fazendo roupas para os filhos, e perde toda a essência da criança. Para mim, uma boa moda infantil é aquela que consegue falar a linguagem do seu público. E melhor ainda se conseguir trazer mudança para esse público, trazer temas interessantes para a vida e crescimento de cada um. Não simplesmente falar de “flores” porque é a nova tendência mundial… Temos que falar de comportamento, atitude. A moda tem que contar historia, tem que trazer emoção. Se não, não é arte… não é moda, é só roupa.
Busco fazer meu trabalho com muita verdade. Acho que isso é o essencial! Quando a gente acredita no que diz, no que faz: faz com amor, com muita verdade… a qualidade e o sucesso é só conseqüência!
Sinto que o mercado de moda infantil hoje está crescendo e criando seu espaço, tendo bastante apoio de organizações e até mesmo do governo! Também podemos ver eventos de moda voltado somente para infantil… Tudo uma grande vitória!
Mas para isso se consolidar de vez, temos que criar espaço dentro da cabeça dos brasileiros, o que é um pouco mais difícil… temos que falar de cultura mesmo, o quanto o povo aceita algo diferente vindo do próprio pais, acreditar nesse trabalho, e melhor: reconhecer. Sinto que ainda não temos a capacidade de “ler” um trabalho de moda conceitual, criador de tendências e de comportamento.
Quando digo brasileiros, me refiro a sociedade de forma generalizada. Sei que há profissionais da moda e pessoas de áreas relacionadas com capacidade incríveis de tudo isso. Mas pessoas leigas da área não tem esta visão de arte, o que cabe em qualquer engenheiro, matemático ou qualquer outra coisa. A essência da moda precisa entrar nessas pessoas, e é possível! E assim eles irão saber consumir moda, e não só comprar roupa.

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