O que seria do verde se todos gostassem do amarelo?

Por Rita Durigan

Eu sei que o que está em questão no Brasil vai muito além de um gosto pessoal. Ou deveria. Mas não vou escrever sobre política, nem tomar partido. Só resolvi compartilhar minha experiência como mulher e mãe em meio aos últimos acontecimentos no Brasil.

Ontem foi um dia tenso. Eu queria ler tudo o que publicavam os jornais e postavam as pessoas, assistir aos vídeos, ouvir aos áudios. Evitei me expor muito nas redes sociais, até porque eu nem sempre sabia o que dizer. Mas eu queria ouvir pessoas mais próximas ao telefone, falar também. Eu não conseguia silenciar minha angústia e ansiedade.

As coisas pareciam mudar ai no Brasil e aqui dentro de mim numa velocidade maior do que minha mente e coração eram capazes de acompanhar. Terminei o dia exausta. Perdida. E triste.

Hoje, depois de uma noite de sono pesado – eu apaguei -, acordei sem a dor de cabeça do dia anterior, mas com uma estranha sensação de desarranjo emocional. Percebi que eu estava assustada e, ao contrário de ontem quando minhas vítimas eram os outros, dessa vez era comigo mesma. Assustada com minha capacidade de julgar, tomar partido e de odiar pessoas e suas opiniões diferentes das minhas. Assustada com as vezes que me exaltei lendo ou comentando a posição de alguém. E pela sensação de que, na maior parte do tempo, me sentia mais confortável espiando tudo em cima do muro.

Me lembrei das muitas vezes que minha filha tentou me tirar do universo em que me meti ontem, que pra ela deve ter parecido uma bolha inacessível. Das vezes que me chamou pra brincar e obteve no máximo meu “agora não”. E essa lembrança me doeu. Porque ela sabia que tinha algo bem estranho em mim, mas não tinha ideia de que. Pode até ter achado que era com ela. Crianças pensam assim, eu sei. E ontem ela deitou em sua caminha e adormeceu sem me chamar para dar a mamadeira, ficar ao lado dela, rezar pra Mãezinha e o Papai do Céu e contar suas historinhas preferidas. Ela simplesmente apagou. Exausta. Talvez mais do que eu. E sem saber o que estava acontecendo.

Eu acredito que crianças mereçam explicação pra tudo. Na linguagem delas, de forma compreensível para cada idade. Elas são parte de nossas vidas e tem direito de entender o que muda nosso humor e nossas atitudes. Afinal, são diretamente afetadas por isso. Mas desta vez eu me calei. Eu não sabia o que dizer.

Hoje eu a abracei e percebi que ela ficou feliz em me reencontrar. Brincamos um pouco e, quando me senti mais leve, falei sobre ontem. Que foi um dia de muita confusão no Brasil, o país onde a gente nasceu e onde mora a nossa família – ela sabe disso, mas gosto sempre de reforçar. Que muita gente brigou, ficou triste e muita gente estava sofrendo. Só isso. E pedi desculpas por ter estado tão agitada. Disse que a gente precisava rezar pelo Brasil e ela concordou: “a noite a gente reza pro Papai do Céu, Mamãe”.

Sim, a noite a gente reza, filha. A gente reza para que a gente possa sempre pensar mais e falar menos. Viver mais e sofrer menos. Respeitar mais e agredir menos. Amar mais e odiar menos.

A gente reza para que tudo dê certo por lá. Pra que as pessoas possam se respeitar mais. Não ajam apenas pela emoção. Que apareçam planos pra nação. Que quando chegar a hora de te contar com detalhes o que está acontecendo agora, eu consiga ser imparcial para que você tire suas próprias conclusões. E que a gente se respeite se pensar diferente. E que até lá o Brasil viva tempos de paz e prosperidade. Ordem e progresso. Independentemente de quem esteja no poder. Porque toda vez que a gente sente saudades de casa, é do Brasil que a gente está falando.


 

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