por Pati Juliani
Este foi o ano de conversar sobre dificuldades, compreensão e aceitação (ou falta de). Foi o ano de repetir e tentar justificar atitudes (nossas, delas, de amigos, conhecidos e nem tanto) com amorosidade e respeito.
– Todo mundo tem suas dificuldades. Uns tem dificuldades de falar; outros, de andar. Alguns tem dificuldade de se controlar; outros, de amar…
Foram muitas conversas. Muitas!
– Por que ele grita? Por que ela chora? Por que ele empurra? Por que ela emburra? Por que…por que…por que…
Mas, ironicamente, foi o ano que elas me viram chorar por atitudes e falas de incompreensão. De julgamento. De ausência – de respeito, de afeto, de amor.
Se o porquê delas eu tentava justificar, os meus eu não conseguia.
E, por isso mesmo, foi um ano de firmamento. Decisão. Escolhas.
Pelo que somos, queremos e sentimos. Pelos valores e desejos que são inegociáveis.
E, apesar do choro, houve firmeza na voz.
– Lembra quando falamos sobre as dificuldades que cada pessoa enfrenta?
Numeramos algumas delas. Detectamos superações. Buscamos entendimento.
– Mamãe, qual é a sua dificuldade?
Muitas! Inúmeras.
Mas o olhar era dela. A fala tinha que ser dela.
– Fale você: qual é a minha dificuldade?
Pausa. Respiro. Conclusão.
– Você tem dificuldade com o tempo. Ele não para e você fica aflita.
Silêncio.
Imediatamente me lembro da Andrea (minha grande amiga e parceira de blog), que diz que nossos filhos nos conhecem mais do que nós os conhecemos. E me lembrei do coelho da Alice (do País das Maravilhas).
– Você tem razão. Tenho essa dificuldade e esse desafio.
Este foi o ano que bordei o relógio do coelho. Foi o ano que voltei a bordar. Foi o ano do tempo que descompassou.
O ano que começou com metas traçadas em verbos (Estar. Ser. Fazer. Construir. Produzir. Dançar. Cantar. Amar), e que terminou verbalizando o tempo (Re)conectar.
Foi o ano do tempo sem tempo. Mas do tempo que atravessou seu tempo.
Uma buscava o canto do sofá para ler. A outra dava cambalhota no mesmo espaço. Uma queria correr, outra queria parar. Mas, em algum momento, elas se encontravam novamente.
O tempo que esperava o tempo.
Dois mil e dezoito foi o ano de revisitar moradas. De cartografar a vida e tecer vôos.
E, revisitando outros tempos, ganhei tempo. Um tempo que achei que já não existia.
Foi o ano de querer parar o tempo. Desesperadamente!
Por medo de ter medo. Por não desejar o enfrentamento. Pelo desejo de isolamento e pelo cansaço. E, por tudo isso, foi o ano do corpo doer, do sexto setênio passar e de muita coisa morrer.
Foi o tempo de resgatar Saramago, de se sustentar em Clarice e (con)fiar.
Teve leitura sozinha de livro grande, início de letra cursiva e desafio de contas armadas. Teve parada de mão perfeita, bananeiras na piscina, cabelo azul e novas músicas na bateria.
Do outro lado, teve mergulhos sem bóias, plantio, busca por novas plantas, estrelas, mais segurança, melhor expressão, desejo de piano e alguns centímetros a mais.
Dois mil e dezoito foi o ano de comemorar com Alice e o coelho correndo contra o tempo que não pára.
Foi o ano do tempo que desafiou o respeito ao próprio tempo.
O tempo que seguiu… no diálogo, nas aceitações, nas dificuldades e no desejo de olhar para frente.
– Mamãe, sua pulseirinha caiu, seus desejos vão se realizar? A minha caiu e meu desejo não se realizou. Eu pedi para voar e não voei.
– Mas esse ano eu te vi voar. Você voou lindamente enrolada em um tecido colorido, em cima de um palco. Você conseguiu e eu me emocionei. Porque eu sempre soube que você queria voar.
– Foi mesmo! A gente pede e acontece. O que você pediu?
– Não me lembro. Faz dois anos que amarrei ela no braço. Mas quer saber? Deve ter sido algo muito bom e importante. E, se eu pedi e acreditei, vai acontecer.
Dois mil e dezoito foi o ano de travar lutas e batalhas pelo que se é. O ano de enraizamento e atravessamentos. De resgate mas também de limpeza – do que não fazia mais sentido e do que deveria ficar.
– Vocês estão crescendo rápido demais. Eu não quero!
– Mas é assim que é, mamãe. Não tem como não querer.
As dificuldades…
Se dois mil e dezoito foi o ano dos verbos, dois mil e dezenove pedirá também sujeitos e predicados. Verbar apenas não bastará.
– Como vencemos essas nossas dificuldades?
– Tendo consciência delas.
– O que é isso?
Seguimos na tentativa de descobrir.
Dois mil e dezoito foi o ano que mostrou que há tempo mesmo quando se acredita que o tempo ficou para trás.
Foi o ano que escrevi. Escrevi para não esquecer. Escrevi para fortalecer. Escrevi para lembrar.
E vamos seguir nas conversas, dificuldades, compreensão e aceitação (ou falta de), porque dois mil e dezoito ainda será muito lembrado. E conversaremos muito sobre tudo isso também.
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