Precisamos reaprender a silenciar

por Rita Durigan

Uma tragédia. Vidas que foram. Famílias destruídas. Uma sociedade em desespero. E o que se vê na sequência são armas apontadas pra todo lado. Mas ontem, exclusivamente ontem, sem a tal munição que tem nos movido. De cabeça quente, todos enlouquecemos diante do apagão das redes sociais. Porque queríamos gritar. Esbravejar. Assumir o papel de senhores da razão. Online. Como se isso fosse curar todas as feridas. Resolver todos os problemas. Trazer de volta todas as vidas e restaurar a Paz. Ou não.

Cabeça quente, sangue fervente e coração desestruturado. Porque tragédias fazem isso com a gente. Desestrutura o coletivo. E como curar a ferida? Como tratar a causa?

Não paramos mais pra conversar. Olho no olho. Pior que isso, não nos calamos mais. Não silenciamos para deixar as coisas se assentarem. Estamos doentes e dependentes. Precisamos o tempo todo gritar, esbravejar, opinar.  Eis me aqui.

Não nos permitimos mais absorver. Isso exige calma. Isso leva tempo. E não temos mais tanto tempo assim.

Atropelamos nossos dias, nossas horas. Não damos tempo da lágrima escorrer. Não damos tempo do coração sangrar. Não permitimos que isso aconteça. Antes, preenchemos com raiva esse vazio que precisa existir pra gente contextualizar e compreender o que está acontecendo. Tanta coisa… Tá difícil, mas faz parte. E a raiva nos consome, nos engole, nos domina.

Estamos todos no mesmo barco. Estamos criando nossas crianças num mundo doente. Estamos todos adoecendo e deixando que adoeçam ao nosso redor.

Precisamos sim nos posicionar. Precisamos transformar. Mas antes, decidir se queremos guerra, e essa se faz com armas de todos os tipos, calibres e alcances. Ou se queremos Paz, e essa se faz a partir da resigninação, da reflexão, do respeito, da compreensão, e, acima de tudo, do diálogo. Mas antes precisamos silenciar. E isso a gente vai ter que reaprender.

*A imagem que ilustra esse post é um recorte de uma foto que tirei em dezembro de 2018 da obra “Lei da Jornada”, do artista chinês Ai Weiwei, em exposição que aconteceu na Oca do Ibirapuera. 

One thought on “Precisamos reaprender a silenciar

  1. Gloria diz:

    O que queremos saber: o porquê disso tudo.
    Arranjamos um culpado ? Os pais do rapaz assassino, o tio , a escola, quem?
    Talvez a falta de amor , o caminho errado que seguiu, a cabeça fraca ou a facilidade de conseguir armas e objetos mortais .
    Um desapego da vida que levava ou o quê?
    Jamais iremos saber. Um episódio fora do nosso controle e que ninguém sabe se pode se repetir. Uma tristeza sem fim para todos os familiares e amigos das vítimas .

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